A era do rádio e os calouros de Uberlândia

Época de Ouro do Rádio, 1950, a orquestra de alunos do Lyceu de Uberlândia em apresentação na Rádio Nacionao do Rio de Janeiro, com Emilinha Borba. À esquerda, o violinista Nicolau Sulzbeck. Foto divulgação.

A era do rádio

Tudo começou no Ano da Graça de Nosso Senhor de 1922. No dia da independência, exatamente 100 anos depois do ato de D.Pedro I, no alto do Corcovado, Rio de Janeiro, foi feita a primeira transmissão de rádio do Brasil, com a utilização de um transmissor de 500 watts, da Westinghouse, para 80 receptores. O primeiro programa foi o discurso do Presidente Epitácio Pessoa. A inauguração oficial se deu aos vinte dias do mês de abril de 1923, a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, com Roquete Pinto e Henry Morize. Os receptores eram caros e importados. Logo sua programação era para a elite e não para a massa. Tocava-se óperas, recitais de poesia, concertos e palestras culturais. Tinha finalidade cultural, educativa e altruísta. Mensalidades eram pagas por quem tinha os receptores através de doações. Os anúncios pagos eram proibidos.

Começou, então, a era comercial, a partir da década de 1930, transformando totalmente a programação radiofônica. O Decreto 21.111 de primeiro de março de 1932, autorizava 10% da programação a ter comerciais. O erudito se torna popular e artistas e produtores começam a ser contratados. A competição trouxe desenvolvimento técnico e popularidade para o veículo de comunicação mais revolucionário da época. O impacto do rádio sobre a sociedade brasileira nesta época, foi muito mais profundo do que aquele que a televisão viria a produzir 30 anos depois.

E veio a Época de Ouro do Rádio, a partir da década de 1940. A programação se torna mais popular e o rádio passa a ganhar mais audiência. Em treze de maio de 1942 surge o Ibope. Neste mesmo ano, estréia a primeira rádio-novela, “Em busca da felicidade”. Começam também as primeira transmissões de esportes e rádio jornalismo. A Copa do Mundo e a Segunda Guerra Mundial marcaram essa época do rádio.

Outra transformação ocorreu no início da década de 1950. Surge o transistor, tornando a comunicação mais ágil, possibilitando transmissão direto da rua ao vivo. Os receptores à pilha, libertos da tomada, dão mais mobilidade aos ouvintes. Mas surge a televisão e os artistas do rádio mudam para a telinha. Os programas de humor são trocados por música, as novelas e programas de auditório por serviços de utilidade pública, buscando uma maior segmentação. As FMs aparecem na década de 1960, e passam a tocar muito mais música.

Os calouros de Uberlândia

No começo dos anos 1950, Uberlândia tinha como veículo de comunicação mais popular a Rádio Difusora. Ela ficava na praça da República, atual praça Tubal Vilela, no prolongamento da avenida Afonso Pena. Como todas as emissoras do país, tinha seus programas de calouros, para adultos e crianças.

José Séptimo Spini, o Zé Spini, nasceu com dom para o canto lírico. Desde menino se apresentava aqui e ali, festinhas, escola e em casa para as visitas. Onde lhe pedissem para cantar, não se fazia de rogado, soltava a voz que Deus lhe deu. A família Spini, de numerosos filhos, não era rica. Geralmente os meninos não ganhavam presentes no Natal. Em um certo ano, antecedendo o Natal, o programa de calouros da Difusora estava premiando os três melhores meninos cantores. Dona Geni disse para seu filho:

– Zé, vai lá! Um prêmio você vai trazer.

O Zé ficou meio acanhado. Seu irmão Glauco, que além de levantar pesos, também gostava de cantar,  empurrou o irmão. E ele foi. Ele gostava de cantar Vicente Celestino, Carlos Galhardo, Francisco Alves, Orlando Silva, mas quem ele adorava era o Gino Becchi. Chegou para o ensaio ressabiado. Cantou Minha Terra, de Waldemar Henriques. Quando terminou o ensaio o pessoal da banda comentou:

– Você vai ganhar, menino!

E ganhou mesmo. Em terceiro lugar ficou uma menina, em segundo, o Humberto de Sá, filho do Manuel de Sá, do Banco de Crédito Real. Zé ganhou uma roupa de vaqueiro, um William Boyd completo. No auditório, Um garoto magrelo, entregador de jornais, que atendia pelo nome de Moacyr Franco apenas assistia.

No ano seguinte, o Zé Spini voltou. Aí também entrou o Moacyr Franco, mas fazendo humorismo. O Zé cantou Porta Aberta, de Vicente Celestino. Ganhou de novo. Desta vez, o Ary Novaes Rocha, com aquele seu jeito maneiroso, puxou o Zé para um canto e disse-lhe:

– Olha, você ganhou o primeiro prêmio, mas nós vamos te dar o presente do segundo lugar e vamos dar o seu presente para o segundo, mas você foi o vencedor.

O Zé, sem entender nada até hoje, aceitou contrariado. O primeiro prêmio era um trem de ferro, com suas linhas e estação. O trem corria pelos trilhos. A família do seu Atílio, pai do Zé, morava pegado às linhas da Mogiana. Ia ser um sucesso com a molecada. Zé teve que se contentar com uma lata cheia de bombons Imperial. Quando desceu do palco com seu prêmio, foi cercado pelo Moacyr Franco:

– Rapaz, com essa voz, você tem que ir pra São Paulo!

Mas o Zé só tinha quatorze anos e não foi. Pouco tempo depois, quem foi pra São Paulo foi o Moacyr, levado pelo Aloysio Silva Araújo, o mesmo que inventou o Bronco, personagem inesquecível a quem Ronald Golias deu vida.

Inspirado em uma coluna do jornalista e escritor Antônio Pereira da Silva.

Apresentação na Rádio Difusora, década de 1950, Uberlândia.
Apresentação na Rádio Difusora, década de 1950, Uberlândia.

 

Praça da República, década de 1950, atual praça Tubal Vilela.
Praça da República, década de 1950, atual praça Tubal Vilela.

 

3 Comentários

    • Francisco, boa noite.
      A rádio Educadora foi inaugurada em 1952, como tentativa de elevar o nível cultural da programação radiofônica, evitando propagandas comerciais, uso de gírias e com programação mais erudita e voltada para a educação e os costumes. Nessa época, muitos setores intelectuais pressionavam o estado a criar rádios com essas características. Sua programação era supervisionada pelo Ministério da Educação. Vamos pesquisar mais e faremos uma publicação futura mais completa. Muito obrigado pelo seu comentário. continue a nos prestigiar.

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